quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

A Natureza Humana

É raro escrever prosas. Quando o faço é como se pretendesse gritar para um bando de gente surda, que vive cega e fechada em si mesma. Faço-o não como um muro de lamentações, para isso tenho a poesia que tento rabiscar, mas como uma forma de purga do que mesmo calando, me incomoda.
Gosto de ver a evolução das pessoas que mudam consoante o vento...algumas são mais firmes, precisam de "pés de vento", outras de furacões...gosto de ver as mudanças em cada um que me rodeia, às vezes parece que estou a folhear um livro que vai mudando a cada novo capitulo. Uns capitulos mais longos, outros menos extensos, alguns deles muito surpreendentes.
Nisso tenho orgulho na minha biblioteca, que vai desde a Divina Comédia de Dante, até ao pasquim do Tio Patinhas que eu lia quando era miuda. É como uma coleção de cromos que vai sempre actualizando.
Noto as mudanças que o meu pai falava tanta vez: "A maior transformação alquimica de todos os tempos, transformar potaça em linhaça" ele usava sempre o segundo sentido desta frase...hoje, vejo exactamente isto.
Gosto de ver quem precisa, quem não precisa, os modos, as formas, as posturas, as importâncias, os cargos, os estados de fúria, os bons humores, os falsos amores, as formas de olhar, os tons de voz... sim, os tons de voz...porque as pessoas ainda não perceberam que suavemente conseguem mais fácilmente do que à bruta...
Não gosto de perceber necessidade, não gosto de ter de calar porque a minha resposta fere mais. Por norma calo. Por norma firo-me a mim.
Vejo pessoas que nos metem no coração apenas para desferirem mais um golpe, mesmo que nós devamos estar mais do que calejados e não esperar nada dos outros...esperamos sempre qualquer coisa do outros, quanto mais não seja gratidão, já que vivemos numa sociedade urbana e interagimos necessáriamente uns com os outros, esperamos sempre algo, que nunca é mau.
Vejo quem nos devia conhecer, diz-nos prosaícamente que nós não conseguimos, como se as suas verdades fossem inabaláveis...a esses vou dar uma novidade, até o muro de Berlim já caiu! Tudo muda! Tudo se transforma...para esses guardo o momento em que lhes direi: Venci!
Essa natureza que faz com que cada ser humano seja único e cada vez mais assoberbado, mais cheio de falta de tempo...ocupado, quanto mais não seja, consigo mesmo; não ter tempo é desculpa, há sempre tempo desde que se queira. Há casos em que por vezes o querer apenas não é suficiente, mas isso, são outros envolvimentos, um dia falarei deles...
É esta natureza que passa de um servilismo confuso a uma atitude de altivez, no espaço de pouco tempo, tento nunca desmerecer ninguém, provávelmente faço mal, mas sei que serve para descansar melhor quando deito a cabeça no travesseiro...quando consigo dormir...
Não costumo escrever em prosa, mesmo alguma ideias pessoais tento passá-las em versos e baladas para ninguém. Talvez por isso neste momento eu ache que me estou a esticar e não digo nada de jeito...não faz mal...tal como a poesia que escrevo, esta prosa também não é dirigida a ninguém...talvez apenas um paliativo da minha acidez...talvez um gesto na escuridão...o meu alerta: Eu estou atenta!
Aceito a Natureza de cada um e as suas modificações.
Aceitem as minhas, que há tantos que já não me reconhecem!

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Entre o ser e as coisas

Onda e amor, onde amor, ando indagando
ao largo vento e à rocha imperativa,
e a tudo me arremesso, nesse quando
amanhece frescor de coisa viva.

As almas, não, as almas vão pairando,
e, esquecendo a lição que já se esquiva,
tornam amor humor, e vago e brando
o que é de natureza corrosiva.

N´água e na pedra amor deixa gravados
seus hieróglifos e mensagens, suas
verdades mais secretas e mais nuas.

E nem os elementos encantados
sabem do amor que os punge e que é, pungido,
uma fogueira a arder no dia findo.

Carlos Drummond de Andrade